Se seu filho tem amigos imaginários, leia e relaxe!
O irmão mais novo da escritora Tatiana Belinky, mãe de Ricardo, tinha um amigo imaginário chamado Bidínsula. "Perguntei como ele tinha inventado aquele nome e ele me falou indignado: 'Eu não inventei, ele me falou'." Ela, que era bem mais velha, bem que tentou usar o amigo para convencer o irmão a raspar o prato. "Olha lá o Bidínsula, aqui do lado, comendo tudo", apelou. E o menino: "ele não está aqui do lado, ele está ali". Pois é. Se seu filho insiste em diálogos imaginários com alguém que você não enxerga, relaxe. Ele não está alucinando nem vendo espíritos. Só está usando a imaginação. "A criança é imaginário ambulante", resume Tatiana, mestre no assunto.
Uma pesquisa do Instituto da Educação em
Londres descobriu que cerca de 65% das crianças tiveram amigos imaginários em
algum momento. Está mais calmo? Então pode começar a ficar animado: o estudo
mostrou também que esses amigos invisíveis tornam as crianças mais confiantes e
articuladas.
O que fazer?
“Deixá-la em paz”, responde a psicanalista
Cecilia Orsini, mãe de Fernanda e Mauro. A criança precisa brincar sozinha
também. Os especialistas são unânimes em dizer que os adultos só devem
participar da brincadeira se forem convidados. A criança sabe que o amigo é
fruto de sua imaginação. Então, não adianta fingir que o está vendo, como fez
Tatiana, isso pode deixá-la confusa. Dizer que aquilo tudo é mentira ou
besteira, também é uma agressão. O melhor a fazer é ficar na sua.
No desenho Charlie e Lola, a menina, de 4 anos,
tem um amigo invisível chamado Soren Lorensen, que aparece representado com
tinta transparente. Para os pequenos, ter um amigo inventado pode ser o caminho
para entender melhor o mundo e as relações humanas. “É o modo que as crianças
encontram de entender como é ter um amigo de verdade”, explica Cecília. Nessa
idade, as crianças são muito auto-centradas e não costumam ter amigos reais
ainda. Por meio da brincadeira, elas aprendem sobre o mundo dos adultos e se
colocam no lugar do outro, conhecendo diferentes pontos de vista.
Além disso, ao criar um amigo só para ela, a
criança fica no controle da situação, poder que ela não tem em outras ocasiões.
É nessa brincadeira que ela abre portas para dividir seus sentimentos de raiva,
tristeza, angústia... Tudo muito saudável.
O amigo imaginário pode ser um travesseiro, uma fraldinha ou até um animal. Seja o que for, representa um apoio. Por isso, ele aparece em situações de ansiedade, como o nascimento de um irmão. Brincando, a criança compreende melhor o que está sentindo.
Até quando?
O amigo imaginário surge, exatamente, quando
ter amigos vira uma preocupação. Até os 3 anos, geralmente o mundo doméstico é
suficiente. Depois dessa idade, a criança se interessa por ter uma companhia.
Entre 6 e 7 anos, ela passa a ter uma vida social mais ativa, deixando os amigos
imaginários para trás. Os de verdade vão aparecer, é só uma questão de tempo. Os
amigos invisíveis só devem ser motivo de preocupação quando a criança começa a
recusar muito sistematicamente a entrada na realidade. Se for o caso, procure um
especialista.
Embora a pesquisa feita em Londres indique que
as crianças que têm maior probabilidade de criar amigos invisíveis sejam os
filhos únicos ou aqueles que têm uma grande diferença de idade em relação aos
outros irmãos, não se trata necessariamente de um sintoma de solidão. Para a
psicanalisa Cecília Orsini, pode ser até o contrário: a criança tem tanta
companhia, que acaba preferindo se isolar no próprio mundinho, que ela
domina.
Soren Lorensen, o amigo imaginário de Lola, é um menino normal, só que cinza e translúcido. Mas quando alguém interrompe a brincadeira dos dois, o garoto fica transparente. Ou seja: não atrapalhe a brincadeira, você pode acabar fazendo o amigo sumir antes da hora. Ele é um bom compaheiro, será que só você não está vendo?